Compliance brasileiro deve seguir exemplo da Itália

O compliance no Brasil ainda enfrenta como desafio uma mudança de cultura para ser plenamente implementado pelas empresas. Para especialistas, o País deve seguir o exemplo italiano, cujos programas de integridade passaram por uma evolução após a Operação Mãos Limpas.

De acordo com o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Sidnei Beneti, os mecanismos de enfrentamento da corrupção foram transpostos para o Brasil, como no caso da Operação Lava Jato, baseada na grande investigação italiana. Faltaria apenas completar o ciclo de aplicação dos efeitos com decisões judiciais punindo todos os responsáveis por práticas ilícitas no âmbito empresarial. “No entanto, mais importante que qualquer decisão é o efeito de conscientização na sociedade de que as ferramentas de controle da corrupção são sérias”, afirma.

Para Beneti, já é possível verificar um maior interesse das companhias em investir em compliance, mesmo aquelas que estão sofrendo com alguma ação na Justiça. “As políticas de controle interno melhoraram, com aumento até da qualidade do produto cobrado no mercado”, avalia o magistrado.

A responsável pelas áreas legal e de compliance no Brasil da Enel, Cristine de Magalhães Marcondes, conta que a companhia, que é italiana e tem sede em Roma, possui um sistema anticorrupção global alinhado ao que prega o Decreto-Lei 231/2001 da Itália sobre responsabilidade criminal das empresas. O programa de integridade da Enel envolve, entre outros pontos, um código de ética, um plano de tolerância zero com a corrupção e um modelo de prevenção de riscos penais.

“O sistema do grupo é um só, o que difere são as adaptações que precisamos fazer em cada país. No Brasil, o maior desafio é a cultura”, comenta. Para a executiva, as empresas que desejarem implementar um compliance eficiente devem envolver todas as pessoas na construção e divulgação do programa. “É importante reforçar isso no dia a dia da organização”, explica.

Segundo Cristine, um outro passo para ter mais sucesso no combate à corrupção internamente é fiscalizar bem as companhias contratadas para terceirizar serviços. “O trabalho envolve escolher parceiros com um bom processo de due dilligence reputacional e cláusulas contratuais com previsão de rescisão de contrato caso haja algum problema ético”, acrescenta ela.

Cristine diz ainda que a Enel presenteia as empresas que seguem todos os princípios éticos estabelecidos. “Queremos tangibilizar para o dia a dia e acompanhamos a aplicação das regras por nossos parceiros. Mantemos até mesmo auditorias independentes para analisarem a nossa situação de compliance”, explica.

O diretor de compliance da também italiana TIM, Piero Formica, ressalta que sua empresa trabalha com uma logística de prevenção próxima dos negócios com processo para avaliações de normas internas, divulgação e treinamento, ações de avaliação de conflito de interesse, partes relacionadas e análise na contração de fornecedores. “Compliance é desafiador, pois precisamos criar uma política que não seja somente burocrática.”

Lobby

Já para evitar a corrupção nas relações público-privadas, o professor da Faculdade de Direito da USP, José Rogério Cruz e Tucci, propõe que a legislação que trata do financiamento das campanhas eleitorais seja revista. Além disso, ele também defende a regulamentação do lobby. “Apenas o combate repressivo não é o suficiente, pois conspira contra a economia. Precisamos de uma disciplina melhor para esses temas, com regras claras que não incentivem práticas como o Caixa 2”, diz. Os executivos e especialistas falaram no Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee) durante o Italian Business Integrity Day, iniciativa lançada pela Coordenação de Combate à Corrupção do Ministério das Relações Exteriores da Itália.

RICARDO BOMFIM • SÃO PAULO